Nem percebia que estava cá em baixo. Aqui, tudo era tão normal. Envolvida, minha vida se impregnava de outras vidas. Nada diferente de tantas outras. O ar respirado era tão apropriado, tão adequado à minha necessidade de ter vida e fazer da vida um tempo para tudo que me era permitido. Meu corpo já estava ambientado até mesmo às mudanças. Passado, presente e futuro, de tudo minha alma era envolvida. Eu era um tecido do mais puro linho que a vida pode produzir. Meus elos... Ah, meus elos se entranhavam de outras pensantes e carregavam, sobretudo, um pouco de cada um, em medida possível. Não nos foi dada a capacidade de ser um Hércules, a ponto de erguer vestígios em grande escala de todos que se nos apresentam na vida. Quisera até fosse.
Embora essa deficiência — se é que posso ver assim —, a normalidade cá em baixo, na superfície do relevo das experiências que todos vivem, eu ia caminhando normalmente, tendo os sustos de todo mundo e tantas quantas fossem as alegrias e tristezas que se podia viver. Eu era um homem da vida cotidiana. Tinha um amor. E a certeza dessa posse me acalantava o ser. Que bom era ser dona da certeza de gostar e ter um alvo desse sentimento. Tudo cá em baixo ia na velocidade e esboço que não fugia ao roteiro comum a todos os seres.
De repente, fui como que catapultado. Vi-me em terra nova. Estranho ambiente. A leveza do ar de outrora deu lugar a um ar sufocante e pesado, tão escuro. Vi-me só, buscando alguém. O medo e o desespero me tomaram. Estava com receio dos sons dos meus passos e a minha sombra tornou-se meu algoz. A minha respiração me assustava e não sabia se iria morrer de asfixia ou de pavor.
Ainda mais que de repente, vi-me aqui no relevo da minha realidade. E tudo que senti falta fez-se assim palpável e visível. Não entendi nada. Fui devolvido ao meu mundo. Tinha minha escola. Meus pais. Meus amigos... Vi sorrisos que pensei haver perdido. Tudo foi tão rápido. Alegrei-me sobremaneira.
De súbito, voltei à terra desconhecida. Agora era diferente. Havia novos amigos, até mais. Alguns não lembrei de quando os conheci. Outros vi que eram de tempo recente. Mas senti falta de alguns antigos. Confesso que uma dor se instalou em mim. Entretanto, eu já podia caminhar com mais segurança e o medo dos sons naturais do meu deslocamento já não me assombravam. Ia andando e descobrindo tudo com certo receio. Aí...
Estava cá de volta, na superfície do meu mais real estado. Presente em corpo tanto quanto lá. Quis o resultado que apenas um abraço me causava. Busquei meu amor e a tive. Em questão de frações de minutos, a vida mudava. Eu era paz e sossego, alegria e agradecimento. Eu era...
Lá estava eu de novo. Agora pobre. Meu trabalho era apenas sobreviver. Minha cama era o relento e o meu sono era a tristeza da minha existência. Meu sonho era dormir e não acordar. Meus pesadelos eram relembrar que tive posses, tive títulos e fui cercado por tantos quantos de mim podiam usufruir do que eu tinha. Vi-me na diáspora existencial. Estava pensando em tudo quando...
Estava de volta aqui em baixo.
Então, desci da gangorra e resolvi viver a vida.
Aprendi que isso não era um sonho, mas a verossimilhança da existência humana. Reprogramei o computador da minha caminhada e, então, preparei-me para não perder a essência da minha natureza e ter arrancado de mim o dna do meu ser, como alma vivente.
Na gangorra, estar presente é inalterável.
Nela, não se perder é o alvo.
Nela, perder-se é fato costumeiro.
Jahilton Magno, 28.03.2015
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