Não sei se neste dia (onde a maior parte dos adultos aproveita mais como apenas um feriado do que um dia especial e dedicado às crianças), teríamos muito que comemorar. Vivemos um momento extremamente perplexante no que diz respeito ao tratamento que se dá a criança hoje em dia e aos rotineiros casos de pedofilia e abuso a ela nas mais variadas formas de sua execução. Ultimamente, tem chegado ao conhecimento do mundo o que tem ocorrido na África, de como lideres religiosos têm tratado crianças de bruxas e feito com elas horríveis e inexplicáveis maus tratos, e tudo em nome de Deus.
Hoje é dia das crianças, é o dia delas e para elas, mas uma tristeza muito grande invade meu coração quando percebo em torno de mim fatos de uma sociedade mundialmente doente na qual ela está inserida. Os pais estão doentes, existem professores doentes, médicos doentes, advogados doentes, políticos doentes, que não conseguem discernir em seus atos o que é certo e o que é errado. A doença instalada nessa sociedade me faz temer o futuro das crianças, que crescerão também doentes, com sua formação psicossocial, emocional, e familiar totalmente comprometida.
Sem deixar de falar na parte espiritual, porque de fato isso também elas são: corpo, alma e espírito. O corpo esta sendo vilipendiado de forma horrorosa, bárbara, demonstrando o que de mais negro e triste existe na alma humana. A alma das crianças vem sendo dilacerada sem ressentimento, e com requintes de crueldade. Estão lhe roubando a oportunidade da felicidade mesmo no presente e o que é mais triste, comprometendo de fato o que poderia ser um futuro. O presente já não tem mais presente, já não tem mais alegria. O prazer da descoberta do natural e do que lhe é tão necessário à vida e a sua formação (como a alegria das amizades, o prazer de conhecer um cinema, o sorriso de estar na praia, o brilho dos olhos pela descoberta de uma leitura, ou mesmo a felicidade de comemorar mais um aniversário ao lado de familiares e amigos que tanto ama), foi imposta e violentamente trocado pelo abuso sexual, pelas feridas no íntimo, pelas cicatrizes talvez, em muitos casos, irremediáveis e inesquecíveis.
Onde existia inocência, agora existe possibilidade de satisfação sexual pela parte dos adultos. Onde existia pudor, agora revelam-se atos criminosos de forma humilhante e muitas vezes quase inconcebíveis por parte de quem assiste, ou está participando e sofrendo direta ou indiretamente. É nessa conjuntura que estamos comemorando o DIA DAS CRIANÇAS. É verdade que todos os dias têm sido delas. Mas como eles também têm sido tão duramente vias de expressão do horror vivido por esses seres tão inofensivos e incontestavelmente necessários à vida! Não somente porque o são em relação à perpetuação da raça humana, mas porque sem elas a vida perde a beleza, pais não tem sentido de viver, mães não terão alegria para continuar a caminhada e a sociedade seria castrada do seu convívio benéfico à alma adulta e ao equilíbrio do mundo.
No DIA DAS CRIANÇAS, diante de tantos fatos hediondos, fico a pensar em como Deus observa tudo, de como o ser humano, com a sua liberdade para livre arbitrar seus atos é capaz de tão grandes atrocidades. Observo o dia das crianças, como uma chance oportuna de refletir os atos do homem na construção da sua própria história, ou talvez na desconstrução da mesma. Interpreto essa data como a chance ímpar da sociedade repensar sua atitude como parte importante nesse processo de modificação dessa realidade. Olho para essa momento, como uma imperativa necessidade de se observar para o alto, para o Senhor e ver nEle a atitude correta em relação às crianças, quando, pela Sua atitude de tê-las consigo mesmo, ensinou: DEIXEM VIR A MIM AS CRIANÇINHAS PORQUE DELAS É O REINO DOS CÉUS. Ou em outra oportunidade ensinou que para entrar no reino de Deus era necessário TORNAR-SE COMO CRIANÇAS. Sim, igual às crianças: inocentes, puras, ensináveis, característica esta última, que o ser humano tem por demasia.
Ser ensinável neste DIA DAS CRIANÇAS seria um imperativo de Deus à toda a sociedade, que necessita aprender dEle como se trata um ser tão lindo, tão necessário, e acima de tudo um ser que é gerado à imagem e semelhança do Criador, e que, de forma tão desrespeitosa e vil, está sendo tratada por nós os adultos.
Ser ensinável seria o melhor presente para dar hoje às crianças, às nossas crianças. Ser ensinado por elas. Ser ensinado que quando se gosta, gosta-se de verdade, e quando não se gosta não é capaz de um ato em maldade. Ser ensina que quando se sorri, sorri-se com propriedade, inteireza e verdade, não com diplomacia para agradar. Ser ensinado que o amanhã nem tanto importa, porque se o hoje não ensinar que tem que haver amor em atitude, não basta querer e sonhar amanhã. Ser ensinado por elas, que o abraço é a chance de demonstrar afeto e o que com ele vem é um ato de confiança incontestável e inabalável. Ser ensinado que o fato de correr aos nossos braços demonstra saudade e necessidade mesmo que se tenha saído de perto há tão pouco tempo. Ser ensinado que ainda que pensem e falem o contrário do que somos, o coração a nós é dedicado como um monumento erigido a alguém correto e íntegro. Ser ensinado que apesar das mais tortuosas e camufladas corrupções em nossa alma e caráter, isso não lhes impede de nos amar e a nós confiar a própria vida. Ser ensinado que a aproximação com sorriso no rosto e nos olhos é um ato de pura singeleza e desprovido de sentimento de barganha.
Este dia é para isso. Para lhes dar o presente que todos os dias, ininterruptamente elas mesmas nos dão e nos mostram como fazê-lo.
Reflita nisso.
Em Cristo, que ensina que é preciso aprender com Ele e com as crianças como mudar.
São Luís, 12.10.09
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